Hwang Po nasceu em Wonsan, na República Popular da Coreia do Norte, em
1945. Aos dezasseis anos viajou para Pyongyang onde foi viver em casa dos tios
e preparar-se para entrar na Universidade. Desde jovem que lhe reconheciam o
talento para duas coisas: jogar futebol e escrever. Po soube, também, que o seu
futuro estaria irremediavelmente ligado a esses dois fenómenos. Em Wonsan
jogava apenas com os seus amigos, mas quando chegou à capital, prestou provas
no Pyongyang City Sports Group, uma equipa acabada de fundar havia poucos anos.
Po jogava nas segundas categorias, enquanto se dedicava arduamente aos estudos.
Entrou na Universidade para o curso de Comunicação Social, começou a trabalhar
num diário da capital como estagiário e treinava sempre que o tempo lhe
permitia. Comparado com os jogadores da capital, era agora apenas um jogador
sofrível, mas Po preferia pensar que isso se devia à sua trabalhosa vida de
estudante dedicado. Tão dedicado, até, que concorreu e venceu um difícil
concurso cujo prémio era desejado por todos os estudantes da Universidade. Uma
viagem a Inglaterra para acompanhar os sucessos da equipa nacional no Mundial
de 1966.
A chegada a Middlesborough, onde a equipa norte-coreana disputou todos
os jogos da primeira fase, logo fez com que Po percebesse que a realidade da
Europa era muito mais apropriada aos seus desejos de jovem jornalista. E assim,
quando não estava em Ayresome Park a assistir aos jogos e a enviar longas
descrições épicas sobre os mesmos, Po tratava de encontrar uma forma de
permanecer em Inglaterra depois do Campeonato. A sua sorte ficou marcada no
golo de Pak contra a Itália, o que prolongava a estadia da equipa e obrigava a
comitiva de norte-coreanos a viajar pela Inglaterra. Po conseguiu fazer a
viagem fora do autocarro que transportava todos os jornalistas que acompanhavam
a equipa e seguiu de boleia num carro com alguns jornalistas ingleses e
escoceses. O plano era simples, a meio do caminho abandonar o jornalismo e o
Campeonato do Mundo e ficar por uma das cidades de Inglaterra. Quis a sorte que
a fuga o deixasse em Halifax.
Mesmo não conhecendo ninguém na cidade, Po era um homem com um plano.
Primeiro que tudo, teria que conseguir entregar-se na Polícia e ser reconhecido
como refugiado político. O facto de falar um inglês perfeito, de a sua família
ter ficado dividida na separação das duas Coreias e de ser, praticamente, um
jornalista, ajudou, e muito, na obtenção do estatuto de refugiado. Depois,
conseguiu completar os seus estudos em Halifax e não resistiu a colocar-se à
prova no Halifax Town, a equipa mais frágil da cidade, que naqueles anos
conhecia a glória na terceira e quarta divisões inglesas. Po jogou durante seis
anos neste clube, conseguindo um total de dezoito jogos oficiais. Era um
jogador fraco, pequeno, mas muito trabalhador. Beneficiava, também, do facto de
ser um refugiado, um homem que recebia apoio social do clube e que, por isso,
era muito acarinhado.
Mas aquilo que tornou Po, ou Mr. Poe como ficara conhecido em Halifax,
famoso, eram as suas belíssimas crónicas no suplemento semanal do clube.
Raramente jogando, Mr. Poe fazia os resumos dos jogos, leitura preferida por
muitos dos adeptos, não pela fidelidade aos acontecimentos, mas pela razão
contrária. Mr. Poe era um esteta, um homem preocupado com o espectáculo e a
fantasia de todos os seus leitores. E sendo o Halifax Town uma equipa mais
conhecida pelos jogos que perdia do que pelos que ganhava, era a literatura de
Mr. Poe que tornava a leitura dos resumos dos jogos do clube tão
apetecíveis. Não tendo tido grande
sucesso como jogador de futebol, o norte-coreano Hwang Po, que com a obtenção
da nacionalidade inglesa ficou conhecido por Mr. Poe, era um fantasista da
bola. Um verdadeiro artista da invenção literária, com uma bola ao pé. Abandonando a prática do futebol, Mr. Poe
ainda hoje encanta aqueles que, em Halifax, correm as ruas em busca das suas
histórias sobre os clubes de futebol locais.
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