Para todos aqueles que não tenham
reparado, acabámos de viver os melhores quinze anos do futebol
português ao nível de selecções. Infelizmente, esse maravilhoso
projecto começado com “Geração de ouro” queirosiana parece ter
entrado na sua fase de declínio, sentindo cada vez crescentes
dificuldades em se qualificar para as grandes provas internacionais.
Na história que já começou a ser
escrita deste período áureo, muitos avançam com as datas
consideradas essenciais para o início desta sucessão de conquistas
futebolísticas. A entrada de Carlos Queirós para os quadros da
Federação, as vitórias consecutivas nos Mundiais de Sub-20, a Lei
Bosman que permitiu que os melhores jogadores portugueses jogassem
nas melhores equipas europeias. Mas arriscamo-nos a avançar com a
data de 11 de Outubro de 1995 como a mais marcante para o que é,
talvez, o maior e inigualável feito mental do futebol em Portugal.
Como em todas as coisas, talvez seja
melhor começar pelo princípio.
O primeiro grande feito do futebol
português data de 1961 quando, liderado pelo jovem José Maria
Pedroto, Portugal organizou e venceu o Torneio Internacional de
Juniores da Uefa, uma espécie de antecessor dos Campeonatos da
Europa de Sub-18. No entanto, só um dos jogadores dessa equipa
(Simões) teria papel de relevo na campanha que levou a equipa
portuguesa ao Mundial de 1966, onde obtivemos um, até hoje,
irrepetível terceiro lugar. Apesar de um período áureo também ao
nível de clubes (o Benfica ganhou duas Taças dos Campeões Europeus
e o Sporting uma Taça das Taças), a mentalidade do futebol
português parece não ter assumido a condição que os resultados
lhe permitiam. E tendo-se seguido uma série de finais europeias
perdidas, tal como foi perdida a continuidade na participação nas
provas de selecções, Portugal entrou num período negro da história
do seu futebol.
Durante as décadas de 70 e 80,
Portugal acumulou craques, vários deles com carreiras
internacionais, mas a selecção não mais conseguiu que uma outra
presença fugaz nos grandes palcos. Humberto Coelho, João Alves,
Jordão, António Oliveira, Vítor Damas, Fernando Gomes e Chalana
foram-se sucedendo na equipa das Quinas sem deixarem marca maior do
que a atingida em 1984, no Europeu realizado em França, logo
obscurecida pelo “caso Saltillo” de 1986 e o que se seguiu: uma
selecção praticamente sem jogadores de equipas grandes, ferida de
morte no mesmo ano em que o Porto conquistava, em Viena, um título
europeu de clubes.
Passando por cima da já citada
“geração de ouro” que conquistou o mundo na categoria de Sub-20
mas falhou a qualificação para o Euro 92 e para o Mundial de 1994,
chegamos então de novo a Viena de Áustria, onde uma equipa local
lutava para não cair nos confins do futebol europeu e recebia
Portugal, que tentava, sob a liderança de António Oliveira,
“conquistar o Campeonato da Europa”. É um facto que este
treinador, um mágico de palavras bombásticas, havia entrado a matar
na liderança da selecção. Pela primeira vez, a mentalidade era
ganhar, levar tudo à frente, em vez de tentar chegar a Europeus e
Mundiais defendendo e batendo em tudo o que passasse da linha do
meio-campo.
No dia 11 de Outubro de 1995, o jogo
empatado depois de um golo de Paulinho Santos, e ainda com vinte
minutos para jogar, António Oliveira não quis defender o resultado
que lhe permitia levar a decisão para a última jornada da
qualificação, em Lisboa. Pôs a mão no ombro do baixinho Dominguez
e disse-lhe “Vai lá para dentro ensinar a esses nazis como é que
se joga à bola”. A terapia de choque que mudaria a psicologia do
futebol português resumia-se toda nessa frase polémica que teria
repercussão nos meios de informação por toda a Europa. Portugal
agora entrava em campo para ensinar aos outros como se fazia.
Quinze anos passados, quatro Europeus e
três Mundiais depois, podemos dizer, sim, nós ensinámos a alguns
como se joga à bola. Mas como manter é mais difícil do que criar,
sobretudo entre nós, portugueses, uma outra terapia de choque será
necessária para passarmos ao passo seguinte. Por exemplo, por uma
vez que seja, ganhar.
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