Natural da ilha de Ítaca, a
aventura de Giannis Ladakis começa no
pequeno clube da sua cidade, o Keravnos Vathi, onde jogou na equipa principal
com apenas catorze anos. Considerado um talento natural, Ladakis foi convidado
a ir para as escolas de formação do OFI Creta, um histórico clube grego. No
entanto, Ladakis nunca se adaptou nem à ilha, nem às gentes. Tendo completado ali
toda a sua formação e os primeiros anos de profissional, Ladakis, em jeito de
brincadeira, chamava à sua estadia em Creta “o meu muito pessoal Cerco a
Tróia”. E a verdade é que um dos seus últimos jogos foi uma guerra contra os
italianos do Atalanta. Num jogo a contar para a Taça das Taças, a 27 de Outubro
de 1987, Ladakis foi um dos grandes heróis que permitiu a vitória da equipa da
casa. No entanto, uma grave lesão nos ligamentos do joelho esquerdo
colocaram-no de fora o resto da época. Ladakis deixaria Creta no Verão
seguinte.
Em 1988, Giannis Ladakis
tornou-se o primeiro grego a jogar no campeonato sueco. Tal acontecimento
deveu-se a um empresário que ele conheceu em tempo de férias, na Ilha de Creta.
Ladakis era um autêntico guerreiro em campo. Um número dez com instinto
sanguinário. Inequivocamente, um grego. Chegou à Suécia para jogar no
Djurgardens IF, um clube de Estocolmo, conseguindo nesse ano ir até à final da
Taça local. No entanto, para Ladakis, jogar naquele campeonato era um constante
encontro com gigantes. Tendo pouco mais de 1m70, o médio grego enfrentava,
semanalmente, defesas com mais vinte centímetros do que ele. Era uma guerra
dura, fisicamente extenuante, que nem o dedicado Ladakis acreditava aguentar
por muito tempo.
No final do ano foi então
transferido para o Viking Stavanger, da Noruega. Stavanger é conhecida por ser
a cidade do vento, tanto que Ladakis se habituou, nos jogos em casa, a não
fazer nenhum passe em profundidade. A única opção era mesmo a de jogar a bola
rente à relva, aguentando o embate do Deus Eólio, que tanto dificultava o seu
jogo. A sua passagem pelo campeonato norueguês não é, em nada, digna de
registo. Na época de 89-90, o Viking ficou a meio da tabela, Ladakis nunca
conseguiu expressar o seu futebol, e decidiu, uma vez mais, procurar maneira de
ser feliz noutro lugar.
Giannis Ladakis era, nesta
altura, um homem sem rumo. O seu empresário levara-o para a Irlanda, onde
assinou pelo St. Patrick Athletic, uma equipa de Dublin. Pela primeira vez, o
seu futebol parecia ganhar brilho longe de casa. A equipa sagrou-se campeã
irlandesa nesse primeiro ano, Ladakis fez amigos entre os jogadores amadores
que partilhavam consigo o balneário, pensou até que Dublin seria a sua cidade
para sempre. Na verdade, esse título foi uma espécie de canto do cisne para o
St. Patrick e para Ladakis. Acumulando dívidas, os jogadores foram saindo do
clube. Ladakis, esse, desfez a ligação ao empresário, encontrou trabalho como
biscateiro e entregou-se à bebida. Brilhando dentro do campo, todas as semanas,
isso não era o suficiente para o fazer feliz. Ia assim perdendo a sua vida
pelas ruas de Dublin. Foram quatro anos em que o declínio da equipa, depois do
brilho do título, estava personalizado no declínio de Ladakis. E só no Verão de
94 Ladakis pareceu encontrar a sua Minerva, o que lhe augurou um futuro de boa
sorte no regresso a casa.
Mas nem isso seria assim tão
fácil. Inspirado a regressar a casa, Giannis Ladakis acabou por aceitar um
convite de um colega que abrira um negócio na Ilha de Malta. O negócio
consistia em receber e distribuir bebida por uma série de estâncias turísticas
na Ilha. Giannis, valendo-se do seu passado de futebolista profissional, acabou
por arranjar lugar na equipa do Rabat Ajax, que nessa época jogava na Segunda
Divisão local. Enquanto em campo Giannis se arrastava, fora dele, as coisas não
podiam correr pior. Por falta de licenças, de conhecimentos locais e de de
alguma sorte, o seu colega irlandês regressou tão depressa a Dublin quanto
tinha voltado, deixando Ladakis perdido em Malta, sem emprego, sem
conhecimentos, salvo apenas pela alimentação que recebia do seu clube pelos
préstimos dados em campo. Foi uma descida aos infernos que fez com que Giannis
acordasse para a realidade. O regresso a casa estava agora mais perto do que
nunca.
Não resistiu, ainda assim, ao
canto da sereia que lhe prometia uma pequena glória futebolística antes de
chegar a bom porto. Foi por isso que assinou contrato com o Alki Larnaca,
equipa do campeonato cipriota. Foram três anos em que Giannis viveu como se de
um grande jogador se tratasse. O clube cedia aos seus jogadores um estatuto de
semi-profissionais. Treinavam todos os dias e faziam pequenos serviços no clube
em troca do seu salário. De resto, podiam aproveitar a vida de Larnaca, um dos
grandes centros turísticos desta ilha. Giannis Ladakis vivia feliz. O canto da
sereia chamava-o para os abusos alcoólicos do passado, mas era agora um homem
com mais de trinta anos, consciente de que precisava de se manter sóbrio para
manter o emprego.
Pelo Chipre ficou até 1998,
quando decidiu voltar a Vathi. Regressou também ao seu clube de origem, o
Keravnos Vathi, um clube das ligas amadoras da Grécia. Quando fez o seu
primeiro jogo, neste regresso, a maioria dos adeptos não o reconheceu. Do rapaz
que tudo prometera, vinte anos antes, pouco sobrava. Giannis Ladakis não tinha
entrado na história. Mas, por outro lado, cumprindo o destino do famoso Ulisses
de Ítaca, Giannis tinha dado a volta ao seu mundo, resistido a todos os
incidentes e acidentes do percurso, e chegava a casa, para ser feliz entre os
seus. Por isso, ao ver a bola beijar aqueles pés calejados de tantas viagens e
a encontrar, pela primeira vez desde o regresso, o caminho da baliza
adversária, os adeptos do Keravnos souberam que o seu rei tinha voltado a casa.
E sentiram-se felizes com isso.
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