quarta-feira, 3 de abril de 2013

Real Madrid v Galatasaray: A Décima terá de passar pelo crivo do Imperador

|Francisco Pinho Sousa



Há jogos que são diferentes porque trazem agarrados a si uma certa carga simbólica. Muitas vezes nem está relacionada com os jogadores, mas sim com os treinadores. O Real Madrid-Galatasaray de hoje é o exemplo perfeito desse simbolismo. Frente-a-frente estarão dois mestres da modalidade: José Mourinho e Fatih Terim. O mundo habituou-se a admirar estes dois treinadores pela sua dedicação ao jogo, pelo sucesso das suas ideias e, sobretudo, pelas suas personalidades fortes. 

Neste caso, apesar do misticismo de ambos os técnicos, podemos quase falar de um confronto entre David e Golias, sobretudo na dimensão histórica e financeira de ambas as equipas. É certo que esta vai ser uma eliminatória muito complicada para o Real Madrid, mas os merengues não deixam de ser totalmente favoritos. Até porque o desejo de vencer a mítica Décima continua a criar enorme ilusão no seio do madridismo. Esta é uma eliminatória que o Real Madrid jamais poderá perder…


Pela frente terá uma das grandes surpresas desta edição da Champions League. O Galatasaray do Imperador Fatih Terim regressou pela porta grande à maior competição europeia de clubes. A fase de grupos teve altos e baixos. Os pontos altos foram os jogos fora e o jogo caseiro frente a um Manchester United de reserva. No entanto, apesar dessa vitória caseira, toda a gente recorda a exibição com momentos a roçar o brilhante em pleno Old Trafford, apesar da derrota (1-0).

Hoje, Terim deverá colocar em campo o mesmo “onze” que brilhou há 3 semanas, na vitória por 3-2 em casa do Schalke 04. Na baliza, estará o seguríssimo Fernando Muslera, guardião com excelentes reflexos e autor de enormes paradas ao longo desta grandiosa campanha europeia dos turcos. A defesa será composta por dois laterais com projecção ofensiva: à direita, Eboué e à esquerda Riera. Se os alas interiorizarem o seu jogo, estes ficam com espaço livre para dar profundidade. No centro, Semih Kaya e Nounkeu. O primeiro é a maior promessa defensiva da Turquia. É um jogador muito técnico e com boa saída de bola, embora lhe falte velocidade, precisamente uma característica inerente a Nounkeu. O camaronês de 26 anos, porém, tem algumas debilidades do ponto de vista técnico e desposiciona-se com relativa facilidade.

O meio-campo é o sector mais forte. O líder é Selçuk Inan, uma autoridade ao nível do passe. Coloca a bola onde quer e além disso é um excelente executante de bolas paradas. Tem jogado mais recuado mas pode desempenhar o papel de médio organizador de jogo. A seu lado, o brasileiro Felipe Melo. Um trabalhador incansável, grande auxílio para Inan e para a dupla de centrais. Pena alguma dureza, por vezes incontrolável. Nas alas, Altintop (direita) e Sneijder (esquerda), com tendência a movimentos interiores, como vimos em Gelsenkirchen. Uma das chaves dessa 1ª parte foi, aliás, a colocação de Altintop mais perto de Melo e Inan e a movimentação de Sneijder para perto da posição “10” (sua posição por natureza). A equipa jogou com maior intensidade e qualidade nesse período de jogo.

No ataque, estão dois autênticos colossos: Burak Yilmaz e Didier Drogba. O turco é o melhor marcador da Champions, a par de Ronaldo, com 8 golos. É um jogador soberbo do ponto de vista técnico e físico. É um finalizador-nato. Além disso, o entendimento com Drogba é perfeito. O costa-marfinense de 35 anos está menos rápido mas mantém intactas boa parte das qualidades que o notabilizaram ao longo dos últimos anos: garantia de apoios, bom controlo de bola e capacidade para jogar fora da área. É o complemento ideal para Yilmaz a este nível. Quer pela experiência, como pela enorme qualidade.

Acredito que os turcos procurarão ter bola. Faz parte do ADN das equipas de Terim. Quanto mais posse a equipa tiver, mas cómoda se sente em campo. O problema passa por travar a transição rápida do Real Madrid. Com extremos verticais e velozes como Ronaldo e Di Maria, os turcos podem passar muito maus bocados se não mantiverem a organização atrás.

Acredito seriamente que o Real possa consentir a posse de bola. Já vimos a equipa de Mourinho fazê-lo em casa perante equipas inferiores (por exemplo, frente ao Athletic de Bielsa). Efectivamente, o campeão espanhol sente-se muito confortável a jogar em contra-ataque.

No entanto, esta é uma opção meramente hipotética, tendo em conta aquilo que conhecemos das equipas. Uma coisa parece-me certa: o Real Madrid vai entrar em campo com o “onze” de gala. Diego López; Arbeloa, Varane, Ramos, Coentrão; Khedira, Xabi Alonso; Ronaldo, Ozil e Di Maria mais o ponta-de-lança Karim Benzema. Tantas poupanças no campeonato indiciam um desejo ardente de levantar a Taça em Wembley. Este é um “onze” das grandes noites. CR7 e Di Maria estão em grande forma, Ozil é um criador de 2ª linha soberbo e atrás há que contar sempre com a visão de jogo de Xabi Alonso e as movimentações mais ofensivas de Khedira. Além disso, atenção a Fábio Coentrão: o português travará um duelo interessante com Eboué. Em velocidade, pelo menos, podemos esperar clara vantagem do miúdo das Caxinas…

Perspectiva-se, então, uma boa partida de futebol. O Real Madrid tem toda a pressão deste e doutro mundo, o Galatasaray tem a expectativa de aproveitar sobretudo o factor-casa, na 2ª mão. Acredito que a equipa de José Mourinho tem condições para deixar a eliminatória bem encaminhada já hoje. No entanto, vale mais ser cauteloso e pensar na eliminatória como um conjunto de duas mãos. Os turcos são fortes em casa, mas quem ganha em Camp Nou ou Old Trafford tem todas as condições para o fazer na Turquia também…

Pontos-chaves do jogo:

1.       Bolas paradas. São o ponto débil do Galatasaray. As marcações são algo descuidadas e abrem espaços para a entrada de jogadores fortes no jogo aéreo. Curiosamente, também o Real sente problemas nesse tipo de situações, em termos defensivos.

2.       Duelo Ronaldo/Yilmaz. Os melhores marcadores da Champions. 8 golos cada. Jogadores de características diferentes, mas de grande qualidade. Se Terim deve entrar em pânico de cada vez que pensa como marcar Ronaldo, também Mourinho não estará confortável ao pensar nas movimentações e qualidade física e técnica de Yilmaz. Bom duelo em perspectiva!

3.       Parar Selçuk Inan. Deve ser uma das prioridades do meio-campo madridista. Asfixiando o cérebro da equipa colocam-se enormes entraves à construção de jogo ofensivo do Galatasaray. Xabi Alonso e Khedira terão papel importantíssimo.

4.       Espaços laterais dos turcos. Por vezes, Eboué e Riera adiantam demasiado. Em situação de posse e construção ofensiva, são jogadores participativos. Depois custa a recuar, sobretudo a Eboué.

5.       Centrais inseguros. Kaya é bom tecnicamente mas extremamente volátil em termos de velocidade. Nounkeu é rápido mas deixa muitos espaços. Com C.Ronaldo e Benzema pela frente, os dois centrais vão ter autêntica prova de fogo. Será muito difícil ajudarem a manter a baliza de Muslera inviolada…

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