|Luís F. Cristóvão
Depois de mais uma prestação internacional de relevo, levando Portugal a classificar-se na quarta posição do Campeonato da Europa de Sub-20 Femininos – Divisão B, Eugénio Rodrigues falou para a Gazeta dos Desportos, analisando o percurso entre Europeus, a preparação da equipa para a competição e os desafios encontrados nesta competição, que teve lugar na Bulgária.
Um depoimento sincero e contundente sobre o trabalho de um selecionador nacional, perante as dificuldades que vão surgindo no caminho de quem tenta modificar a face do basquetebol feminino em Portugal.
Eugénio Rodrigues em ação! |
1-Depois do que aconteceu com a Seleção Sub-20 Feminina no ano passado, com a descida nas condições que todos conhecemos, este ano havia alguma “sede de vingança” no grupo? Como foram geridos esses sentimentos ao nível da preparação psicológica e de motivação para a competição deste ano?
Esta Seleção tinha no seu seio 4 atletas que transitavam do ano passado, sendo que todas elas jogavam no 5 inicial e uma delas era inclusivamente capitã de equipa. Era por isso uma memória ainda muito presente e que deveria ser aproveitada para servir de mola motivacional para o restante grupo. Por um lado, elevar os níveis, já por si muito exigentes, de sacrifício pois se no ano transato tínhamos "sobrevivido" com honra e distinção naquelas circunstâncias, este ano importava manter a fasquia. Por outro, fazer passar a todo o grupo que a injustiça a que tínhamos sido votados exigia uma "vingança" e um tributo ao grupo de 2012. Era também por elas que iríamos a jogo. Infelizmente, ficamos a um cesto sofrido a sete décimos do final do jogo com a Letónia de o conseguir. No entanto, o meritório 4.º lugar não deixou ser a justa homenagem a essa Seleção e o tempo há-de trazer-nos de novo à ribalta.
2-O que destaca da preparação para uma competição deste nível? Quantos jogos de preparação foram realizados? O que falta ainda, à estrutura das equipas da nossa federação, para estarmos, no que toca à preparação, ao nível dos nossos concorrentes?
Pela positiva há que destacar o bom número de jogos de preparação que tivemos até porque todos eles foram fruto de convites das Federações Francesa, Checa e Búlgara. É sinónimo do reconhecimento internacional da nossa qualidade. De menos positivo, a crise financeira que se alastra também à FPB, que levou a cortes sucessivos na preparação e a estágios desta Seleção. Isso aliado à enorme dificuldade em conjugar a nossa preparação com os exames escolares, foram claramente fatores menos conseguidos neste trabalho e cujas consequências foram sensíveis. Para que conste realizamos até ao campeonato europeu, apenas 32 treinos e nem todos eles com a totalidade do grupo. Quanto ao mais, onde temos muito a melhorar é no dia-a-dia da época desportiva, nos clubes e nas competições nacionais. É aí que muito se joga, indiretamente, na preparação de uma geração que irá servir de base à Seleção Nacional.
3-Ao realizar oito jogos em 11 dias, vencer num campeonato europeu é algo que tem mais implicações físicas e psicológicas do que a nível de talento. Como se gere um grupo para uma intensidade competitiva destas?
Nádia Fernandes em modo Fight Club |
4-Portugal termina a competição em 4º lugar, com quatro vitórias nos primeiros quatro encontros e quatro derrotas nos seguintes. Tratou-se de um capricho do calendário (encontrar antes as equipas mais frágeis, depois mais fortes) ou a equipa quebrou ao defrontar a Rep. Checa e a Letónia, ficando tão perto de uma vitória que poderia ter sido decisiva?
Um pouco das duas coisas. Os adversários da 2.ª fase, com exceção da GB eram mais fortes. Dos 4, três foram os 3 primeiros classificados, daí que já estivéssemos à espera deste resultado. Depois, isso somado ao esvaziar competitivo que a derrota com a Letónia nos trouxe, deixando-nos num 4.ª lugar donde já não sairíamos, acabou por ditar algum descontrole emocional nas jogadoras, e refiro-me ao jogo com a GB obviamente. Ao fim de um mês e meio a trabalhar intensamente e sempre nos limites, foi virtualmente impossível manter as atletas 100% focadas no último dia, quando sabiam de antemão que aquele jogo já não trazia qualquer outro resultado prático que não fosse o de vencer aquele jogo.
5-Como se processa o scouting para uma competição como este Europeu? Os adversários foram observados previamente? E durante o torneio, as equipas são observadas de maneira a alinhavar estratégias para os encontros?
De observações prévias ao europeu tínhamos apenas a Rep. Checa pois jogamos com elas por três vezes. Para o jogo com Israel, por ser o primeiro, tínhamos apenas os dados relativos aquela geração em europeus anteriores e os resultados dos jogos de preparação com outras Seleções. Com a Roménia, e porque folgaram na 1.ª jornada, idem. Já das outras Seleções, tínhamos o scouting feito sempre com um ou dois dias de avanço. Ou seja, passávamos praticamente o dia no pavilhão, observando in loco quase todos os jogos, depois recolhíamos o vídeo do jogo, editávamos o que pretendíamos com um software próprio para o efeito e com uma duração máxima de 5 a 10 minutos, mostrávamos em sessões de vídeo com o máximo de 30 minutos de duração e no treino diário de 45 minutos, a estratégia era montada em campo. Este é o nosso dia-a-dia em todos os europeus.
6-A Jéssica Almeida, a Joana Jesus e a Inês Pinto terminam aqui a sua etapa nas seleções jovens. O que pode a Federação fazer para manter estas jogadoras com “mentalidade de seleção” no intervalo que irá daqui, a sua última presença nas Sub-20, até à possível integração na Seleção AA?
Jéssica Almeida, a melhor marcadora da equipa |
7-As restantes nove atletas somaram aqui uma importante etapa do seu crescimento enquanto atletas de alto nível. O que poderemos esperar desta equipa na preparação para o próximo Campeonato da Europa, em 2014?
Bom, nesta altura é difícil responder a essa questão pois vai depender da evolução diária do trabalho delas nos seus Clubes. Como principio, esperamos contar com elas todas por forma a rentabilizar o trabalho feito este ano, mas isso por si só não é garantia de nada. Depois, há que juntar a geração de 95 que para o ano será Sub-20 e claro, eventualmente algumas atletas de 96 que possam ter qualidade para subir de escalão. Eu não conheço o futuro nem consigo adivinhar o que nos espera mas uma coisa eu posso assegurar, é que salvo imponderáveis cá estaremos novamente para o ano e ainda com mais ganas do que neste. O "Clube de Combate", como foram carinhosamente apelidadas, não se esgota numa geração, antes é uma forma de estar na competição. Podemos nem sempre vencer, mas na entrega nunca seremos derrotados.
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Agradecendo ao Eugénio Rodrigues pela disponibilidade, deixo, uma vez mais, o incentivo à discussão do que vamos publicando sobre o basquetebol nacional, através dos comentários ou de textos que queiram ver publicados no nosso blogue.
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